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NotíciasA tragédia do acidente com o jovem Gabriel Diniz e a tragédia da cobertura jornalística sobre aviação, no Brasil.29/05/2019

Um acidente, quando toma as manchetes, sempre provoca comoção, ainda mais quando vitima pessoas conhecidas do público. Em se tratando de um desastre aéreo, a AOPA Brasil antes de tudo rogará pelo conforto dos familiares e amigos dos passageiros e tripulantes envolvidos.

O desastre com a aeronave Piper PA28A, prefixo PT-KLO, que transportava o jovem cantor Gabriel Diniz, ocorrido em Sergipe, num voo que ocorria entre Salvador e Maceió já é objeto de investigação pelas autoridades aeronáuticas brasileiras.

Infelizmente, porém, a perda dos três jovens ainda não serviu para que o jornalismo brasileiro aproveitasse a oportunidade para começar a oferecer à sociedade informações esclarecedoras para a compreensão dos fatos.

Pelo menos até aqui, praticamente toda a cobertura jornalística não abordou os fatos objetivos que podem ter causado o acidente. As "noticias" rodam em torno de declarações sobre o tipo de operação autorizada para a aeronave que se acidentou, sem demonstrar o óbvio: há dois assuntos diferentes em questão.

Um assunto diz respeito ao acidente em si: Por que o avião não chegou ao destino planejado, acidentou-se e produziu as tristes fatalidades?

Outro, diferente do primeiro, é: por que o chamado "táxi aéreo clandestino" se proliferou no Brasil?

Acidentes aeronáuticos ocorrem quando uma aeronave não consegue cumprir a missão que tinha planejado executar, vitimando passageiros, tripulantes, bem como outras pessoas e bens, em terra.

Não por outra razão, quando ocorre um acidente aéreo, o órgão de investigação envia equipes para o local com técnicos com décadas de experiência, que se dividem em 8 especialidades (no caso da agência de investigação de acidentes norte-americana – o chamado NTSB, por exemplo):

  • Operações: identificar a história do voo que se acidentou e dos seus tripulantes, visando conhecer a trajetória de cada um deles por tanto tempo antes da ocorrência quanto for necessário.
  • Estruturas: documentação das partes da aeronave acidentada, incluindo cálculos sobre possíveis ângulos de impacto para buscar compreender a trajetória que a aeronave percorria antes da colisão.
  • Motores: exame dos motores, hélices – quando for o caso – e demais acessórios.
  • Sistemas: Estudo dos sistemas da aeronave acidentada, tais como hidráulicos, pneumáticos, elétrico, eletrônico e demais componentes necessários ao controle de voo.
  • Controle de Tráfego Aéreo: reconstituição dos serviços de tráfego aéreo que foram oferecidos a aeronave acidentada, incluindo telas de radar e gravações de comunicações que possam ter ocorrido antes do acidente.
  • Meteorologia: obtenção de todas as informações meteorológicas possíveis sobre a região do acidente, sejam elas providas pela agencia meteorológica ou por agências de notícias especializadas.
  • Performance Humana: estudo da performance humana antes do acidente, bem como fatores que podem ter provocado erro humano, tais como fadiga, medicação e álcool. Históricos médicos, treinamento, carga de trabalho, funcionalidade do equipamento e informações sobre o ambiente de trabalho também são obtidos.
  • Fatores de sobrevivência: documentação sobre danos decorrentes do acidente, sistemas de evacuação, planos de emergência e todos os meios empregados para o resgate.


“Então quer dizer que ninguém do NTSB quer saber se o governo americano tinha ou não dado autorização para aquela aeronave fazer o tipo de voo que estava fazendo, quando investigam um acidente”? 

Claro que isso é observado, mas jamais tratado como causa primária de um acidente, simplesmente porque aeronaves não se acidentam por causa do tipo de autorização que o estado dá ou deixa de dar ou do que diz o adesivo que está colado na fuselagem de uma aeronave.

O inverso disso também é verdadeiro: "autorizações", sozinhas, não são nem nunca serão capazes de evitar que acidentes ocorram. Não é só porque uma atividade é permitida, que é segura.

Ao assistir notícias sobre acidentes, no Brasil, o que se viu até aqui foram causas sendo solenemente ignoradas. Nesse caso com a aeronave PT-KLO, a mídia em geral, fixou-se em repetir que “a aeronave não estava registrada para realizar táxi aéreo”.

Aeronaves caem porque perdem condições de voo, não pelo que está escrito no papel, no certificado ou numa licença “concedida” pelo estado.

Quando uma aeronave se acidenta, isso ocorre, na grande maioria dos casos, por falhas humanas, de operação e técnicas. É disso que se tratou, também e infelizmente, este acidente. Os técnicos irão estudar e descobrir essas causas, indicar o que precisa ser feito para que outros acidentes não se repitam.

A apuração de atividades ilegais e violações de regras sequer ocorrerá por quem investiga o acidente, mas por outras autoridades, que tratam do que é ilegal, irregular ou do que é crime.

Já sobre a disseminação do táxi-aéreo clandestino, uma atividade ilegal, nada foi dito sobre os porquês disso ocorrer no Brasil.

Ninguém sequer pensou em investigar os efeitos do ambiente de negócios nefasto que os empreendedores brasileiros da aviação estão submetidos?

Ninguém entrevistou proprietários de táxis aéreos para perguntar o que os tem levado a não ter mais quase nenhuma aeronave própria nas suas frotas?

Não houve curiosidade para saber como o cipoal de regras, impostos e outras jabuticabas fazem do Brasil um lugar em que uma empresa aérea, maior e mais forte do que operadores privados e táxis aéreos, vá à falência a cada 2 anos?

Afinal, por que por aqui os táxis aéreos praticamente desapareceram enquanto a aviação (particular, de táxi aéreo, de propriedade compartilhada, etc.) cresce e se torna mais segura em outros lugares do mundo?

O essencial, na aviação, são pilotos treinados, aeronaves bem equipadas, sistemas de tráfego aéreo seguros e infraestrutura de qualidade, independentemente de qualquer coisa, de qualquer operação ou de qualquer “homologação”. Requisitos mais rigorosos devem ser exigidos de quem presta serviço ao público, pelo simples fato de haver relação de consumo, mas esses requisitos, sozinhos, não necessariamente criam operações mais confiáveis nem tornam as operações privadas, obrigatoriamente menos seguras ou confiáveis. Segurança é um primado da aviação antes de ser da regulação.

Quanto tempo mais demoraremos para que se passe a ter respeito pelas vítimas e pela sociedade, abordando os acidentes de maneira mais técnica, profunda e objetiva? A crença do brasileiro no "papel", na "autorização", no estado como controlador de tudo e "garantidor" da qualidade precisa ser desconstruída. No caso da aviação, qualquer operação pode ser segura, desde que realizada nos limites da máquina e dos aviadores, com doutrina, disciplina e procedimentos.




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